TOKYO — THE HUMAN WORLD

A Kyūbi arregalou os olhos. Ela se desgarrou do honem e ficou de pé, contemplando o selo ser quebrado. Se ouviu um crack, e então o sino em seu pescoço rachou. Ele caiu em pedaços, com a Kyūbi retirando a coleira sem problemas. Não mais sentia choques. Foi então que uma aura vermelha a rodeou, mudando sua estrutura para a de uma mulher crescida. Nove caudas brotaram, todas brancas e felpudas. Era como se tivesse ficado anos mais velha.

"Sim, sim!" Ela ria consigo mesmo enquanto mutava para sua forma original. Os olhos amarelos com pupilas afiladas as de uma serpente.


"Assim fica muito melhor." A Kyūbi passou a língua pelos lábios quando a transformação terminou. Mexia os dedos e admirava seu corpo. Ela voltou a olhar para o homem. "Agora acredito que vá implantar lealdade em mim, não?"

"Tsc. Tanto faz. Posso estar presa a você, mas não pense que isso é uma garantia de salvação. Há muitas coisas que ainda posso fazer..." A Kyūbi deu um sorriso malicioso. "A propósito, não quero nomes. Não sou seu pet." Ela balançou os cabelos negros enquanto movimentava as orelhas. Podia ouvir cada humano na Terra conversando.

"Mas então, o que você quer?" A Kyūbi cruzou os braços. "Não fez um pacto porque gostou de mim."

A Kyūbi se surpreendeu com o beijo. Então ele era ousado. Após o ato, ela apenas colocou a língua para fora e viu a marca ali. Ele era seu mestre agora. O gosto daquelas palavras eram amargas. Odiava ter de ser a sombra de um mortal. Porém, pelo menos, ela tinha sua forma de volta. Não sabia se ficava feliz ou com raiva, seus sentimentos ainda estavam mesclados. Apesar de tudo, ainda era livre para fazer o que quisesse visto que o selo do rapaz foi bem livre.

"Uma de minha raça, é?" A Kyūbi cruzou os braços. Não estava nem um pouco interessada naquilo. "Quem sabe? Nós kitsunes não gravamos o nome dos nossos jantares. Será difícil se não souber nada além de que ela saboreou seus parentes."

A raposa riu.

"Que ironia. Uma kitsune acabou com seu clã, e agora você está aqui, de frente para uma." Ela voltou a se aproximar, usando da unha afiada para roçar na bochecha do homem. Agora tinham o mesmo tamanho. "Você me é familiar. Ou melhor dizendo, seu gosto é. Já que não posso te atacar, você teria algum parente restando para eu me entreter?" Brincou.

Pablo nunca achou que se daria tão bem como dançarino de rua até chegar em Tóquio. O que ele fazia ali? Bem, isso ele não sabia, mas seus instintos haviam   sentido uma anomalia rolando ali. Era difícil até para ele explicar, mas ele havia ficado bom em sentir a magia em determinados locais desde que havia aceitado abrigar parte daquele monstrengo meio bode. Nem precisou se preocupar em aprender a língua local, apenas precisou murmurar umas palavrinhas e pronto! Aquilo era novo para ele também, sempre que ele queria alguma coisa, as palavras e algumas vezes ingredientes necessários apareciam em sua cabeça como se tivesse um livro decorado dentro da cachola. É claro que sua língua havia queimado por semanas e ele ainda conseguia ver a inscrição em latim ali escritas "mille linguis", embora aparentemente só ele conseguisse vê-las, mas desde então, sempre que precisava as palavras em japonês fluíam tão facilmente de sua boca que parecia que as falava desde o nascimento e algo lhe dizia que aquilo também poderia acontecer com outras línguas também.

Mas, voltando para a dança de rua, aquilo era algo que ele não precisava de magia para realizar bem. Estava sem camisa mesmo pelo clima friozinho da cidade e usava sua máscara de demônio para esconder a face, embora aquilo não interferisse em nada nos seus movimentos e a música, é claro, estava estourada. As pessoas jogavam dinheiro no chapéu disposto logo do lado da caixa de som que nem loucas. 40 mil ienes em 3 horas dançando e ele nem estava se esforçando! A raiva no olhar dos artistas concorrentes era tanta que até chegava a queimar suas belíssimas costas bronzeadas, mas ei, ele tinha que sobreviver, ainda mais depois de sua doce abuela ter lhe expulso de casa atirando doses de sal grosso suficiente para tornar hipertensa a população inteira da china, o que naturalmente havia sido outro motivo para ele ter decidido ir para o Japão.

Ele provavelmente teria ficado muito mais tempo ali, mas seu sensor de magia explodiu bem no momento em que estava terminando, fazendo-o se desequilibrar todo e cair de cara no chão no meio de seu mortal. Bufou, ouvindo as risadinhas de quem estava assistindo, mas ao menos eles achavam que aquilo era parte do espetáculo. Bem, ao menos aquilo podia significar um pouco de ação! Quem sabe poderia arranjar alguém para um duelo de bruxos ou o que quer que gente da sua raça fazia quando se encontravam no mesmo lugar. Com aquela ideia em mente, conseguiu chegar facilmente até onde seus dois alvos estavam, chegando a tempo de ver o beijo que eles compartilhavam.

"Fiu fiu~" Assobiou das sombras, retirando a máscara para revelar os olhos avermelhados e o brilho lunático que eles emanavam. Sorriu para a dupla, sem qualquer exitamento na hora de invadir uma cena tão "íntima" como aquela, mas o que mais eles poderia querer fazendo aquilo no meio da rua?"E ai colega quatro-olhos de magia ou seja lá o que você for e mulher gatona das várias caudas! O que fazem dando uns pegas tão safadinhos em meio a uma rua movimentada dessas? Tem menores de idade olhando!" Cumprimentou-os ainda animado, as nomenclaturas surgindo em sua mente tão subitamente quanto os encantamentos "Kitsune e bruxo."

A Kyūbi deu um sorriso sutil.

"Proteger, sim, porque vocês mortais são tão frágeis quanto papel." Ela imitou o carinho, mas foram as unhas afiadas que usou para acariciá-lo na face bem lentamente. Quando ele falou em destino, a Kyūbi só pôde dar uma risadinha. "E o que você faria? Me esganaria até à morte? Saiba que sou imortal quanto a esse tipo de coisa." Ela levou a unha até a boca, até perceber um humano próximo.

"Outro bruxo." Disse, sem surpresa na voz. "Esse não seria nada mal matar." A Kyūbi lambeu os lábios. Ao ouvir Edward, ela só deu um risinho. "Que ótimo, então matarei os dois depois de ludibriá-los."

Por mais que gostasse de sua forma imponente, a Kyūbi decidiu usar de sua habilidade para virar uma mulher. Suas caudas regrediram, assim como suas orelhas e marcas no rosto. "Assim fica mais fácil de conseguir uma presa."

"Eu pensei que vocês japas fossem comportadinhos, mas eu mal cheguei e você já vem se oferecendo? Bem, acho que isso é natural quando você se depara com alguém tão quente quanto yo." Piscou para o outro bruxo ali, antes de se voltar para a tal Kitnete, ou seja lá qual fosse o nome daquela coisa. Ao ouvi-la falar de matar, ele simplesmente sorriu, não parecendo nada amedrontado com a ameaça.

"Bem, chica, minha abuela sempre disse que bater em vocês era ser covarde, mas não acho que ela contava com as com caudas felpudas quando disse isso. E tenho minhas dúvidas se pulverizar você bem na frente do seu namoradinho de óculos aí contaria como bater." Riu, como se a ideia lhe fosse divertida, enquanto assistia sua transformação, terminando com um assobio ao ver o resultado. "Uau, se eu não tivesse certeza que pegaria algumas pulgas eu quase invejaria uma de suas presas. Quase."

A Kyūbi rolou os olhos.

"O que um verme como você está falando?" Ela sorriu. "Pulverizar uma raposa de nove caudas? Ha! Faça-me rir. Você não passa de resto de comida de Yōkai. Alguém deveria acabar com sua miséria e te engolir de uma vez." Suas palavras eram cruéis e rudes. "Suas palavras não me atingem, mortal. Sou superior a você tanto em intelecto quanto beleza. Me poupe de seu falatório sem sentido."

Ao sentir os toques de Edward, a kitsune aumentou o sorriso malicioso.

"E o que não seria frágil? Tudo em um humano é frágil. E não me chame de gatinha." Ela o afastou com uma mão. "Ver vocês vivos está me dando fome. Talvez eu devesse tirar um pedacinho do meu novo mestre ou decaptar esse rato que tenta me incomodar."

Pablo ficou paralisado ao ouvir as palavras rudes da raposa, os olhos umedecendo e a boca tremendo completamente chocado com suas palavras. Sua voz saía tremida enquanto ele, aparentemente assustadíssimo, se afastava do casal. "A-Ai senhora de nove caudas assustadora, por favor, tenha piedade de mim! Eu realmente não quis ofender uma presença tão honrosa como você!" Respondeu com dificuldade devido as tremedeiras, antes de abrir um sorriso maior que antes e começar a rir.


Sua risada era tão contagiante e alta que até algumas pessoas que passaram por perto pararam para rir também. Os avermelhados ainda pregados na mulher, enquanto a risada apenas ficava mais alta. "Ai, você é engraçada, dona! Você, tipo, vem toda orgulhosa me chamar dessas coisas mesmo que no fim não passe de uma simples subordinada do carinha aí, né? Um bruxo, um humano, assim como eu! Ai, isso só não é mais engraçado do que quando eu arriei a calça do Tio Elico na frente de todo mundo no meio da comemoração do Dia de los muertos!"

"Se o humano for poderoso, eu não ligo. Ser um shikigami não é uma ofensa, apenas um empecilho. Mas pelo visto ele não se importa com meu comportamento desde que ele não saia morto." A Kyūbi trocou olhares com Edward e depois com o moreno à sua frente. "Me pergunto que gosto você tem, verme, mas só de pensar em pôr minhas presas em você já me vem uma ânsia de vômito. Você não parece em nada apetitoso, agora que percebo. Se nem pra ser comida para Yōkais você serve, qual seu propósito na Terra então?" Ela riu.

"Embora para onde, huh?" A Kyūbi cruzou os braços. "Eu prefiro carne humana. Sangue são para sanguessugas. Leve um humano com seus poderes mágicos até o lugar onde vamos e estarei satisfeita."

"Você fala isso, mas você deve estar doidinha pra colocar essas patinhas esqueléticas e essas presinhas de cachorra no meu pescocinho, aposto! Se está curiosa, por que não dar uma provinha? Querendo ou não, todos e todas sempre acabam voltando pro Pablo aqui!" Piscou, lembrando dos dizeres contantes de sua Madre "Se ela está pegando no seu pé, é certo que deve gostar de você!" duvidava que fosse o caso, a velha sempre foi meio doidinha da cabeça, mas quem sabe? E ao menos serviu para resposta.

"Enfim, enfim. Foi uma belíssima conversa com usted, chica, quem sabe a gente não repete outra hora e você me mostra o que mais pode fazer além dessa sua língua de naja? Talvez você até me mostre que outros usos você tem para ela." Riu, deixando o sentido malicioso por trás da frase, antes de conjurar mãozinhas ilusórias logo acima da Kitsune, que usou para bagunçar seu cabelo e dar tapinhas leves em suas costas. Ele passou a ignorar a mulher completamente após isso, como se desse por encerrado o assunto, voltando sua atenção ao outro bruxo que a acompanhava. "Hm, então está indo levar a serva para uma caçada noturna, é? Admito que ver uma bola de pelo carnívora como ela se alimentando não é o meu passatempo predileto, mas essa cidade é tão chatinha e você sabe como é, né quatro-olhos? Dois bruxos talvez trabalhem melhor do que um e eu ainda não esqueci do seu convite." Mesmo com a pergunta implícita questionando se poderia ir, a expressão de Pablo deixava bem claro que ele simplesmente os seguiria se recebesse um não como resposta. Havia acabado de achar aqueles dois e eles já haviam se provado um ótimo jeito de passar o tempo. Ele não deixaria eles irem tão fácil assim.

A Kyūbi olhou nauseada para o moreno. Ele só falava besteiras. Não se dignou a responder depois de receber aqueles tapinhas, pelo que apenas se esquivou. Não queria que lhe tocassem. Ela apenas observou o quanto o jovem era intrusivo e chato, como uma pulga insistente que você quer ver morta.

"Parece que você conseguiu um mascote." Disse para Edward, olhando o garoto. "Boa sorte com ele. Vou arranjar algo para comer. Você não se importa com esses humanos, né? Ou talvez você não tenha ninguém a apresentar? Eu ficaria contente em comer carne de um ser mágico—que não seja o fedorento aí. Ele me dá náuseas."

"Awwwwnt, você me ama tanto que mesmo depois de terminada a discussão ainda tenta me fazer voltar com seus insultinhos de cadela! Que fofinha que você é!" Sorridente, ele olhou aos arredores concentrando, erguendo o nariz como se tentasse farejar algo. "Ah, isso seria fácil. Provavelmente o portal que trouxe você aqui trouxe outros também, essa cidade tá cheia de magia, acho que o branquelo aqui sente isso também, não sente? Eu poderia buscar alguém sozinho, pra falar a verdade, mas você provavelmente não vai querer algo oferecido por um fedidinho, certo? Que pena, logo hoje que acordei com vontade de ajudar os necessitados!" Ele deu de ombros, como se não desse a mínima para a observação, e de fato, ele não dava.

A Kyūbi ignorou o blá, blá, blá do outro. Não acreditava que ele fosse capaz de muita coisa. Quando ouviu as palavras de Edward, ela deu um sorriso malicioso. "Oh? Hehe. Realmente, parece que vamos nos entender bem. Um humano que pouco liga para seus iguais. Divertido. Não me espere, alcanço você depois."

E assim ela caminhou com o grupinho atrás de si para uma área mais deserta da cidade, onde pudesse os devorar sem interferências.

"Isso só não foi mais frustrante do que quando eu descobri que as nuvens não eram realmente de algodão doce!" Bufou, observando a mulher se afastando com o bando de azarados seguindo-a. A facilidade e frieza que o companheiro bruxo fez aquilo foi tão irritante para Pablo que ele se segurou para não lhe dar um chute nos países baixos. Onde estava a graça em simplesmente balançar um cetro enfeitado e boom, uma refeição completa? Pablo queria um pouco de ação, para variar, e não deixou de olhar irritado para o outro quando a Kitsune havia finalmente se afastado. Se lembrou que sequer sabia os nomes dos membros da dupla, mas tampouco achava que eles o diriam se perguntasse, pelo menos da parte da raposa.

"Logo quando eu achava ter conseguído a chance de uma boa briga ou pelo menos uma caça! Você estragou o clima, branquelinho." Resmungou, estendendo os braços para frente enquanto entrelaçava os dedos a fim de estalá-los. O sonzinho irritante ficou ecoando pela rua agora deserta, mas isso não amenizava sua expressão irritada."Bem, já que não consegui minha diversão que tal irmos para o plano B? A primeira rodada de bebida você que paga! Enfim, vamos meu mais novo amiguinho de bruxarias, a noite está começando e eu estou morrendo de sede!" E dito isso, ele saiu pelas ruas de Tóquio a procura de algum lugar para poder se embebedar, além de arrastar o outro consigo durante todo o percurso.

"Porque se não a vida ficaria muito chata, oras! E você tem um rubi no seu cetro! Você vai realmente vir me dizer que não tem dinheiro para bebida?" Ele ergueu uma de suas sobrancelhas com uma expressão desconfiada. "De qualquer forma, isso não é desculpa! Você acabou de fazer aquele monte de pessoas ir direto para a morte, convencer qualquer velho moribundo a dar bebidas gratuitas não seria difícil." Cruzou os braços, parecendo mais irritado a cada momento e também mais propenso a lhe dar um chute.

"Veja bem, meu companheiro branquelo de quatro-olhos, você vai vir beber comigo nem que eu tenha que ir te arrastando até o buteco mais próximo. Eu não vou beber sozinho porque é deprimente, e sinceramente, não acho que você tem muita coisa pra fazer além de ficar esperando sua amiguinha de nove caudas voltar." Ainda sorrindo, ele colocou um de seus braços ao redor do pescoço do bruxo, encarando-o com aqueles olhos malucos. Ele não estava brincando a respeito da ainda ideia de arrastar. "Certo, cabrón?"

A Kyūbi demorou um bom tempo saboreando suas vítimas. Era do tipo de se exibir até mesmo na hora de se alimentar, pelo que tomou forma de uma raposa de nove caudas à medida que estraçalhava suas presas. Até que o pacto com o humano não era ruim. Apesar de gostar de trazer o caos, a Kyūbi era um tanto preguiçosa e poderia se acomodar com aquilo. Foi em meio as suas transformações que ela descobriu ser capaz de voltar a forma que tinha quando selada, algo de pouco agrado. Gostava mais de sua forma imponente. Ao término da refeição, ela apenas se ajeitou e se voltou à aparência humana de antes. Agora tinha de achar Edward, algo não muito difícil para alguém como ela que podia ouvir tudo e todos aos quatro cantos do mundo.